Por Redação | Lúcio Vérnon
Segundo o Informe Bahia. Uma denúncia formal apresentada pela Controladoria Geral do Município de Correntina ao Ministério Público de Contas e ao Ministério Público Estadual revela indícios graves de irregularidades na contratação de um empréstimo milionário durante a gestão do ex-prefeito Maguila. O contrato, no valor de R$ 3 milhões, foi firmado com a empresa China Gold Bank S.A., mas segundo a documentação oficial, o contrato foi assinado antes mesmo da empresa existir juridicamente.
A operação de crédito foi efetivada em fevereiro de 2020. Entretanto, a certidão da Receita Federal atesta que a empresa China Gold Bank S.A. só foi formalmente aberta em 5 de fevereiro de 2020, enquanto o contrato de financiamento aparece assinado com data anterior: 18 de fevereiro de 2019 — ou seja, um ano antes da fundação oficial da empresa.

Contrato sem autorização da Câmara Municipal
A gravidade da operação não está apenas na cronologia contraditória. A Controladoria identificou que o empréstimo foi contraído sem autorização legislativa, violando o disposto no artigo 165 da Constituição Federal e na Lei de Responsabilidade Fiscal. Além disso, certidões da Câmara de Vereadores de Correntina e da própria CGM comprovam que não houve qualquer projeto de lei aprovado para autorizar o endividamento.
Recursos depositados sem previsão orçamentária
O valor do empréstimo foi creditado diretamente em contas da Prefeitura, como mostram extratos bancários obtidos pela CGM. Entretanto, não havia qualquer vinculação orçamentária prevista para esse recurso — o que, segundo a representação, fere os princípios da legalidade orçamentária, da transparência e da responsabilidade na gestão fiscal. Documentos anexados ao processo revelam ainda que parte dos recursos foi movimentada com rapidez incomum, sem detalhamento nos processos de pagamento. “Há fortes indícios de simulação contratual e montagem documental para dar aparência de legalidade à operação”, aponta o relatório da Controladoria.
Banco investigado não possui sede funcional
Outro elemento que reforça as suspeitas é a própria condição da instituição contratada. Em resposta a ofício da CGM, a suposta sede da China Gold Bank S.A. não pôde ser localizada, e a correspondência oficial retornou com aviso de “destinatário inexistente”. Além disso, consulta ao sistema financeiro revelou ausência de operações ativas regulares em nome da empresa.
O que diz o ex-prefeito?
A reportagem buscou contato com o ex-prefeito Maguila por meio do WhatsAPP, encaminhando o link da matéria já repercutida na imprensa baiana e solicitando esclarecimentos. O ex-prefeito nos escreveu a nota abaixo em sua íntegra:
Esclarecimentos sobre a denúncia de operação de crédito irregular em Correntina.
Correntina, 27 de junho de 2025
Em resposta às notícias amplamente veiculadas em 26 de junho de 2025, acerca da denúncia da PGM do Município de Correntina contra o ex-prefeito de Correntina, Nilson José Rodrigues (“Maguila”), a respeito de uma suposta operação de crédito no valor de R$ 3 milhões com a empresa CHINA GOLD BANK S.A., alguns pontos requerem esclarecimento:
- Sobre a operação de crédito – A operação firmada entre o Município de Correntina e a empresa CHINA GOLD BANK S.A, foi objeto de procedimento contratual
à época com base nos elementos necessários e com base em linha de crédito disponível e mais econômica ao Município face à análise de mercado, dentro do contexto de necessidade de financiamento para investimentos públicos em infraestrutura e esgotamento sanitário, amplamente realizados. Não houve qualquer conduta que violasse os princípios da administração pública, em especial a legalidade, a transparência e a prestação de contas regular aos Tribunais de Contas e Órgãos de Controle.
- Da autorização legislativa para assunção da operação de crédito – Ao contrário do disposto na denúncia, há sim Autorização Legislativa para assunção do financiamento cuja natureza resta clara na íntegra da Lei Municipal 1.063/2019 publicada no Diário Oficial do Município em sua Edição nº 3873.
- Da improcedência da alegação do firmamento do negócio antes da constituição da empresa – O contrato firmado com a instituição foi assinado e registrado em 18/02/2020, porém em virtude de um erro material (corrigido através de aditivo) há uma versão de contrato que exprime erroneamente a data de ‘’ 2019 ‘’, razão que resultou no julgamento do juízo de valor do Controlador Interno e o induziu a propagar notícia equivocada que não encontra guarida. Toda a operação foi declarada nos informes fiscais do Município e submetida ao crivo do Tribunal de Contas do Município do Estado da Bahia.
- Da quitação da operação e da estrita conformidade desta – Afirmo que a operação foi integralmente adimplida dentro do meu mandato no exercício 2021, em conformidade às taxas e limites fixados no átrio do painel de juros e remuneração do Banco Central do Brasil.
- Direito à ampla defesa e repudia a um ato político – É importante destacar que não há até a presente data qualquer tipo de notificação ou cientificação a mim quanto aos fatos divulgados pela PGM do Município de Correntina, tratando-se de divagações especulatórias que serão rebatidas ao passo da oportunização do direito ao exercício da ampla defesa e ao contraditório, que foram afastados quando da exploração sensacionalista e midiática por parte da PGM que concedeu entrevistas e divulgou fatos amplamente improcedentes ante a apuração sensata e condução de institucional.
Reitero minha confiança na Justiça e no devido processo legal, certos de que os esclarecimentos serão suficientes para demonstrar a regularidade dos atos praticados.
O que diz a legislação sobre esse tipo de operação de crédito
A Lei Municipal nº 1.063/2019 é citada pelo ex-prefeito como justificativa para a contratação do crédito. No entanto, ao ser analisada por especialistas em finanças públicas e legislação orçamentária, a norma apresenta fragilidades formais e materiais que impedem seu reconhecimento como autorização legítima para a operação de crédito.
O ordenamento jurídico brasileiro exige que todo empréstimo público seja precedido de uma autorização legislativa específica, acompanhada de estimativas de impacto orçamentário-financeiro e comprovação de compatibilidade com o plano plurianual (PPA), a lei de diretrizes orçamentárias (LDO) e a lei orçamentária anual (LOA). A ausência
desses elementos torna qualquer autorização genérica — como a citada Lei nº 1.063/2019 — insuficiente para respaldar legalmente uma contratação de dívida.
A própria Lei de Responsabilidade Fiscal, em seu artigo 32, é clara ao determinar que a contratação de operações de crédito pelos municípios depende não apenas de autorização legislativa específica, mas também da inclusão dos recursos no orçamento e do parecer prévio favorável da Secretaria do Tesouro Nacional. A falta desses requisitos compromete a legalidade do ato e pode configurar irregularidade grave.
Assim, embora mencionada como respaldo jurídico, a referida lei municipal, segundo pareceres técnicos, não possui eficácia legal para legitimar a operação realizada com a China Gold Bank S.A., tampouco afasta as obrigações legais de transparência, controle e responsabilidade que regem a administração pública.
Próximos passos
A Controladoria encaminhou o caso ao Ministério Público, que deve agora analisar os elementos apresentados e decidir pela abertura de inquérito civil ou ação judicial. A equipe de investigação do jornal Folha Corrente seguirá acompanhando os desdobramentos deste caso.